domingo, 19 de dezembro de 2010

Afinal, o que queremos nós?

Marta – Vocês viram o último episódio de Afinal, o que querem as mulheres?
Vinícius – Vi e quase chorei.
Arlete – Eu vi e não entendi nada. Aliás, como não entendi a série inteira. Ô programinha mais doido!
Vinícius – Tu é que és doida! Um dos melhores programas da televisão brasileira desde sempre. Acho que você não entendeu porque é mulher e ele era voltado para o homem entender a mulher. Bom, pelo menos foi assim que eu interpretei.
Marta – É meio doidinho, sim, mas teve momentos muito bons. Então quer dizer que você achou que foi um manual feminino, Vini?
Vinícius – Não um manual. Mas um cara com uma sensibilidade aguçada querendo entender as mulheres e, de quebra, mostrando várias facetas delas. Eu me identifiquei bastante com o personagem mesmo tendo uma profissão completamente diferente da dele.
Arlete – Identificou em que sentido? Por que conquistou tantas mulheres como ele, eheheheh?
Vinícius – E eu tenho essa sorte... E também, o que adiantou ele ter pego tantas se só queria uma. E é exatamente nisso que eu acho que a série tocou legal. Vocês mulheres são tão complexas que reúnem milhares, talvez até milhões aí dentro. E não estou falando de TPM. As falas do personagem André nesse último episódio foram simplesmente do caralho!
Marta e Arlete – Quais?
Vinícius – Ah, foram várias, mas as melhores vieram nas dois últimos blocos. No penúltimo, quando ele está dançando com Lívia no forró é um dos melhores diálogos. O primeiro é quando André diz a Lívia: “É que você tem um lugar dentro do meu coração que é só seu e que jamais será ocupado por mulher nenhuma.” Ela chega a desacelerar a dança e diz que sente o mesmo. Aí que depois vem o mais foda.
As duas – O quê?
Vinícius – “E tudo que se viveu de verdade não acaba”. É assim que a vida é!
Arlete – Vini, tu tá parecendo drogado com essa conversa. Nunca vi uma série de televisão fazer um efeito como esse em alguém.


Realmente, o rapaz parecia que não ouviu a provocação da amiga e continuou lembrando os textos como se os personagens estivessem ali ao seu lado, soprando no ouvido todas as falas.
Vinícius – Depois eles param e vão conversar. Ela diz que não daria certo como mulher dele porque ele era possessivo, inquisidor e tal. Ele ri e pergunta se ela o ama. Ela diz: “Como eu nunca amei ninguém na minha vida.” Depois ele aparece na praia com a filha. Outro grande diálogo entre homem e mulher, ainda que se trate de um projeto de mulher. Ela pergunta se parece mais com o pai ou com a mãe. Ele diz que com os dois mas que ela parece mais é com ela mesma. Claro que vai ter que explicar: “Você é eu, a mamãe, os amigos que você escolhe e que escolhem você. Cada pessoa é uma mistura de escolhas e desejos” Isso é muito foda, me fez começar a questionar o que sou, o que ando escolhendo ou desejando. Pra mim volta àquela história da lei do retorno. Pra ele, a questão tem que ser o que desejo e não o que sou. As escolhas que fazemos. Aí pergunta porque costumamos ser tão cegos aos nossos próprios desejos? Pra mim é pelo filtro que nossa criação nos impõe, a escola, o trabalho. Acho que deveríamos voltar um pouco aos primeiros anos de nossas vidas e dar vazão aos nossos desejos. Eu mesmo desejo tantas coisas boas mas fica tudo travado aqui dentro. Ao contrário, o que é ruim é quase vomitado. E não tenho medo disso. Por que tenho medo de ser bom, de querer o que é bom? Acho que é de me machucar, de ver que os outros não sabem ver o bom. O último diálogo é com a filha e nunca me bateu tão forte o vazio de não ter uma. Ou um.

Marta (interrompendo) – Pois agora vamos todos lá pra casa pra assistir de novo essa série. Eu não estou lembrando de nada disso que você está falando e tô achando lindo... Vamos, vamos.

E foram.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Estranged

Na falta de algo interessante para dizer, vai o vídeo de uma das melhores canções desde sempre. Estranged do Guns. Poucas vezes vi letra e melodia se encaixarem tão bem, ainda mais num ritmo "barulhento" como o hard rock. vai um link com a letra e tradução também. Sempre achei a letra a minha cara (modéstia à parte).

Depois arrumo algo legal pra dizer.



http://letras.terra.com.br/guns-n-roses/17128/traducao.html

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Oração do morto de cada dia



Eu vou morrer de tédio, de calor, de frio, de tesão, de amor, de ódio, de paixão, de dor de dente, de dor de cabeça e de cotovelo. Eu vou morrer. Eu vou morrer de saudade... de quem veio e já foi. De quem foi sem ter sido notado. De quem sequer veio e talvez nunca venha. De quem veio, voltou e agora dá saudade de quando tinha ido. Eu vou morrer de felicidade, de tristeza. Vou morrer asfixiado pelas minhas próprias lágrimas, pelo meu próprio vício, pelo meu próprio travesseiro. Eu vou morrer cantando, sorrindo, esperneando, praguejando o bom e rezando pelo mau. Eu vou morrer de loucura só para não saber que já morrera há tantos anos sem encontrar um lugar. Eu vou morrer congelado, carbonizado, estrebuchando feito porco no matadouro. Eu vou morrer agarrado a um livro, a uma mulher, às paredes do meu quarto para que meus segredos venham comigo para sabe-se lá onde. Eu vou morrer fedido, cheiroso, ao som de uma ópera-rock, ao som de um samba e de uma marcha fúnebre. Eu vou morrer sem sentir nada, pois tudo que sentia acabou na hora da morte. Eu vou morrer de um pé na bunda, de um “eu te amo”, de um “foda-se”, de um “oxe”, de um “meu filho”, de um “meu pai”, de um “me ama”, de um “me esquece”, de um “a gente não combina”, de um “você errou”, de um “parabéns”. Eu vou morrer de um coice de cavalo, de uma mordida de cobra, de um ferrão de escorpião, de um atropelamento, de um tiro, de um beijo ou de um orgasmo. Eu vou morrer de ler, de escrever, de falar, de contar e recontar. De encontrar, de perder, de jogar fora, de esquecer, de lembrar. De comer, de beber, de cair, de levantar. Eu vou morrer de rir até faltar ar. Eu vou morrer afogado numa banheira, tropeçado numa calçada, escorregado num degrau de escada. Eu vou morrer na cadeia por ter matado o filho de uma mãe e um pai. Eu vou morrer por engano pra que minha mãe chore o choro de outra mãe. Eu vou morrer porque não nasci peixe, mas para que minhas cinzas sejam atiradas ao mar e lá eu fique eternamente. Eu vou morrer porque não fui jogador de futebol, piloto de fórmula 1, estrela do rock ou palhaço de circo. Eu vou morrer porque do filho não se fez-se o pai. Eu vou morrer para plantar uma semente na areia, uma estrela no céu ou um anjo da guarda. Eu vou morrer de gosto e de desgosto, de raiva, de prosa e de poesia.

Eu vou morrer de vida como morremos um pouco todo dia.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Meu copo quebrou novamente

Ele quebrou-se. O meu copo. Como todos os copos, era de estimação. Daqueles que não carregam só água, refrigerante, sucos ou outros líquidos. Carregam nossas almas, nossos corações. Minhas lágrimas. Talvez seja esse último o item mais abundante nos seus 250 mililitros. Não era o primeiro copo, aquele que a gente guarda lá desde a infância, mas era o único. Jamais beberia em outro lugar que não fosse nele. E quando cheguei em casa, até a secretária sabia o que dizer. Pena que para ela era cômico.

- Quebrei seu copo. Sempre o teu, né?
- É – Respondi, sem a mínima vontade de rir. Sempre o meu.


O mais irônico nisso tudo é que nunca, jamais, quebrei um copo que fosse meu. Foi sempre o dos outros. Talvez seja por isso que a dor quando via os cacos era sempre maior, como se tivesse perdido alguém próximo. E não é sempre assim com os copos?

É neles que colocamos nossas bocas. As mesmas que beijam, que contam mentiras, que xingam o juiz no estádio, que cospem no prato que comeu. Que trazem para dentro de casa as bactérias das mucosas que encontramos pela vida afora. Quantos segredos, planos por virem a luz do dia, declarações de amor a serem ditas foram embora naquele “crash” Foi como se tudo isso morresse, se desintegra-se como os vermes farão um dia com nossos corpos. E agora? Será que copos reencarnam ao seu bel prazer? Ou uma cola bem feita faz ele voltar? Não sei as respostas. Os copos são arredios, misteriosos, bi, tri, tetrapolares até. E minha sede continua aqui, esturricando-me a garganta...