domingo, 5 de setembro de 2010

Complicadamente descomplicado (parte I)



Rebeca e Walter viviam numa relação complicadamente descomplicada. Se gostavam e se curtiam em vários níveis, principalmente físico e intelectual. Por isso e por causa disso, se tocavam mais do que como amigos. Em bom português, gostavam de se comer sem que isso atrapalhasse a amizade e a admiração de parte a parte. Mas era inevitável, essa liberdade que experimentavam e davam um ao outro vez por outra oscilava entre o aproveitamento fácil – da parte dele – e a velha rebordosa da parte dela: não pensar duas vezes na hora de desprezar.

Cada um tinha motivos para isso. Ele curtia uma adorável solteirice com várias mulheres a seus pés. Não que fosse o mais bonito, gostoso ou inteligente. Mas tinha lá seus encantos e não faltava-lhe companhia. Já ela nunca fora a número um da turma. Em compensação exercia uma força descomunal sobre os homens, que não respeitava cor, credo, idade e classe social. Vez por outra não respeitava até orientação sexual, dadas as bichas que não raro a assediavam.

Não se viam tatnto quanto se falavam, fruto da internet. Mas sempre que batiam os olhos um no outro, algo estranho acontecia. Mas em casos desse tipo sempre tem um dia – ou uma noite – em que as coisas desandam. Uma palavra mal colocada ou frase dita pela metade é o suficiente para estourar uma bomba. Pois aconteceu num daqueles domingos chatos, já terminada a tarde e iniciada a noite que precede a tão temida segunda-feira: o retorno ao trabalho, à rotina, hora para isso e aquilo. E como todo mundo, ou quase, morre de véspera, o terreno já estava pronto para a tensão que se seguia.

O bate-papo, de acordo com relatos da época, virou febre na internet. Tudo porque o computador de Rebeca foi invadido no dia seguinte e o hacker, atrás de senhas ou algo que pudesse render-lhe dividendos, teria ficado tão puto que, vendo o esforço em vão, vingou-se publicando o diálogo inteiro. Começou aquele papo meio sem sentido, tipo oicomovai, fizesse isso, fizesse aquilo, e o trabalho e todo preâmbulo constante no roteiro. No meio das conversas havia sempre um comentário, uma lembrança, que funcionava como senha para um dos dois promover o encontro. Era um acordo meio tácito, instintivo.

Um comentário:

Renatinha disse...

Lá vai ele com sua estratégia de romancista! Tá bom, a gente espera a parte II.