sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Meus livros (parte II)




Quando fui Morto em Cuba - Roberto Drummond
Primeiro volume de contos que aparece na minha lista. Aliás, um tipo de texto que tenho uma grande admiração, principalmente quando o contista em questão é Roberto Drummond, mineiro, mais famoso por um romance que virou série na Rede Globo: Hilda Furacão. Seu livro mais conhecido de contos é A Morte de DJ em Paris. Mas para mim, esse Quando fui morto... mostra um melhor uso da linguagem. Os contos ainda ecoam a fase mais politizada do autor, que procura mostrar pedaços da realidade do Brasil nas décadas de 60 e 70 durante o regime militar. Falam de solidão, violência, paixões arrebatadoras e até homenageia um grande craque do passado: o atacante Heleno de Freitas, que brilhou no Botafogo e morreu louco num hospício no interior de Minas Gerais.


Feliz Ano Novo - Rubem Fonseca
Mais um volume de contos de outro mestre nessa narrativa. Fonseca guarda semelhança com Roberto Drummond: a facilidade com que muda a forma de narrar. Sempre em primeira pessoa. A temática do livro quase sempre aborda a violência, como no conto-título e “Passeio Noturno”, em que o protagonista tem por hobby atropelar cidadãos comuns no meio da rua. O livro, lançado em 1975, foi recolhido das livrarias no ano seguinte por “conter matéria contrária à moral aos bons costumes” e liberado apenas em 1989.


Misto Quente - Charles Bukowski
Como quase tudo que o Velho Safado escreveu, trata-se de um texto autobiográfico. Nele, o onipresente em suas obras Henri Chinaski conta sua vida desde a infância pobre num bairro longe do centro glamuroso de Los Angeles e as agruras do que é crescer sem ser rico, bonito, popular e não levar jeito para esportes. Típico “loser”, o garoto sofre nas garras dos colegas de escola nos punhos do pai alcoólatra, em casa, casos hoje que recebem as pomposas alcunhas de bullying e violência doméstica, respectivamente. Mas aqui, a saída não é metralhar coleguinhas nem virar bandido. Chinaski trata a vida com a mesma violenta e crua ironia em passagens que podem assemelhar-se a socos no estômago de um leitor mais desavisado.


Uma Estadia no Inferno - Arthur Rimbaud
Falar da pequena mas fundamental obra do poeta francês e não citar sua vida controversa é impossível. E embora as duas se vejam diametralmente opostas, para mim, uma antecipou a outra e isso fica bem claro em várias passagens de Uma Estadia... Numa prosa poética carregada de imagens, Rimbaud conta suas desventuras na vida com a Virgem Louca, fala de seus antepassados e mostra sua visão de futuro, que pode facilmente assemelhar-se ao dele mesmo. Isso escrito antes de completar duas décadas de vida. Depois, partiu para o verdadeiro inferno: viagens intermináveis nos mais inóspitos desertos africanos para voltar com a pele escurecida e com um câncer avançando velozmente – e que o mataria em novembro de 1891, com apenas 37 anos. O título deste blog foi tirado de uma carta dele.


Pergunte ao Pó - John Fante
Pegue um tema simples como um aspirante a escritor em dificuldades financeiras e uma garçonete e você tem o quê? Aparentemente, uma história entre dois comuns como tantos que habitam o planeta Terra. Mas nas mãos de John Fante isso ganha cores tão belas que nos leva a chamar de arte. Com simplicidade, sacarmos e bom humor, o escritor conta a história de seu alter-ego, Arturo Bandini, às voltas para fazer-se reconhecido pelo dom de escrever e, ao mesmo tempo, seduzir sua musa Camila Lopez. As brigas do casal formam os melhores diálogos deste livro, que despertou em Charles Bukowski a vontade de tornar-se escritor. Virou um filme razoável em 2006, com Colin Farrell e Salma Hayek nos papeis de Bandini e Camila, respectivamente.


O Evangelho Segundo Jesus Cristo - José Saramago
Um amigo disse que sua fé ficou abalada ao ler esse livro. Em mim, ao contrário, reforçou-a por ver que o Cristo de Saramago era um homem humano, já desde o nascimento, quando ele diz que “o filho de José e Maria nasceu como todos os filhos dos homens, sujo do sangue de sua mãe, viscoso das suas mucosidades e sofrendo em silêncio. Chorou porque o fizeram chorar, e chorará por esse mesmo e único motivo.” Assim como todos nós, Jesus sofre com a sua missão, tem dúvidas e num dos trechos mais polêmicos vê que Deus e o Diabo são como gêmeos, excetuando as barbas do primeiro. Como era de se esperar, o livro recebeu forte oposição da comunidade católica mas não impediu que o gênio de Saramago fosse reconhecido com o Prêmio Nobel de Literatura, em 1998.


Dom Casmurro - Machado de Assis
Tudo bem que Memórias Póstumas de Brás Cubas é o marco inicial do nosso Realismo. É um monumento da literatura brasileira, mas Dom Casmurro, além do talento de contador de histórias de Machado de Assis, também traz em si um dos maiores mistérios das letras: afinal, Capitu traiu ou não Bentinho? O personagem crê nisso piamente, mas o autor nos dá indícios contaminados, já que é o próprio Bentinho quem lembra a história já velho e de mal com a vida, fato que lhe dá o apelido do título da obra. Os olhos de ressaca de Capitu já fazem parte do imaginário popular. Fernando Sabino reescreveu a obra (Amor de Capitu), mas nem assim conseguiu desvendar o mistério que, acredito, nem o próprio Machado saberia responder.

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